Mão de obra Mercado de trabalho em ebulição
Samuel Rodrigues
Atualizado às 11h30
O Porto de Santos vive um momento distinto. Dois novos players chegam ao mercado nos próximos anos para movimentar contêineres e granéis líquidos. Juntos, contratarão 2,5 mil pessoas para seus terminais – mão de obra local, prometem. Embora o discurso oficial seja um tanto diferente, a abertura das instalações da Embraport e da Brasil Terminal Portuário (BTP) no complexo santista promete acirrar a disputa pela contratação de profissionais mais experientes e prontos na região.
Para evitar perdas de trabalhadores em funções estratégicas, e que exigem anos de prática, os terminais já instalados irão oferecer novos treinamentos como diferencial a seus funcionários.
Acima de tudo, esta disputa por profissionais é encarada no setor como uma resposta do mercado ao crescimento da economia brasileira. Os investimentos de bilhões de reais nos portos acompanham a previsão de manutenção das atuais taxas de consumo e produção no País, somadas a uma política nacional voltada para a melhoria da infraestrutura logística, com base nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Executivos da Brasil Terminal Portuário (BTP), por exemplo, atribuem à dragagem de aprofundamento, tocada com verba do PAC, a escolha do Porto de Santos para sua instalação. O que se sabe é que a qualificação de profissionais não caminha de mãos dadas com o progresso, o que é visto por alguns como entrave e por outros como oportunidade de crescimento.
Por estas razões, o passe dos profissionais mais experimentados na operação está valorizado e alguns deles devem aproveitar esta janela de oportunidade para conseguir melhores salários ou novos desafios.
O grande fator de preocupação são as funções para as quais exige-se maior experiência. Existe um certo acordo de cavalheiros entre os terminais para que não haja um ataque aos funcionários de terminais já instalados. “Não adianta a gente entrar numa de roubar fulano ou beltrano. Ninguém ganha com isso”, disse o presidente da Embraport, Francisco Nuno Neves, em 25 de agosto passado, durante debate no fórum Santos Export, promovido pelo Sistema A Tribuna de Comunicação, em Santos.
Apesar do tal acordo, é certo que algum movimento já está acontecendo, em casos pontuais. E se aumentar os salários para blindar seu pessoal não é considerado pelas empresas uma saída comercialmente inteligente – pois eles mesmos não querem inflacionar o mercado –, alguns terminais têm optado por investir em programas específicos de qualificação. O objetivo é possibilitar o crescimento profissional dentro das empresas.
“Buscamos dar uma série de treinamentos. Capacitar estas pessoas é uma forma de manter talentos”, explica a gerente de Recursos Humanos Corporativo do Grupo Libra, um dos principais operadores de contêineres de Santos, Tarcila Chiodin.
Tarcila conta que uma das diretrizes do grupo é possibilitar aos próprios funcionários mudarem de cargo, conforme cargos ficam vagos e oportunidades surgem. “As vagas são publicadas nos murais das unidades e as pessoas se candidatam. Foi a maneira que encontramos de dar uma oportunidade transparente de desenvolvimento pessoal e profissional”.
Perguntada sobre o assédio que novas empresas na região possam exercer, ela disse: “Isso acontece também em outros setores. O Grupo Libra está sendo assediado, mas também tem muita gente querendo vir trabalhar aqui”.
A baixa taxa de desemprego, na casa dos 5,5%, é um termômetro do momento bom do País, no que diz respeito ao mercado de trabalho, argumentam alguns executivos ouvidos pela Reportagem.“ O que a gente está vivendo hoje, não só a Santos Brasil, e não só o segmento, é o reflexo do aquecimento do mercado”, declara o diretor de Recursos Humanos da Santos Brasil, Alcino Therezo Júnior. “Estamos fazendo alguns programas para retenção. Vamos fazer parceria com alguns terminais para formar profissionais”, completa.
Segundo um executivo, um acordo está sendo costurado com a Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra). A ideia é formar parcerias com as universidades locais no intuito de preparar pessoas segundo necessidades das empresas portuárias. Mas é certo que uma firma, sozinha, não gera demanda suficiente para abrir uma turma. Ou seja, de uma hora para outra, velhos concorrentes podem dar as mãos pelo bem comum de preparar seus futuros funcionários. “É algo que está em estudo”, explica.
De forma isolada, a Santos Brasil também vai bancar cursos universitários para formar profissionais. Há um programa de formação, com bolsas de R$ 1mil para estudantes de graduação.
Acordo
Com a possibilidade de disputa por profissionais no horizonte, também as autoridades tomam medidas para evitar distúrbios. “Definimos com as empresas alguns princípios laborais. O primeiro deles é que elas usem mão de obra do Ogmo (Órgão Gestor de Mão de Obra) de Santos, para que não haja um desequilíbrio concorrencial. Se eles (os novos terminais) rompessem com isso, os outros também o fariam”, diz o presidente do Conselho de Autoridade Portuária (CAP) de Santos, Sérgio Aquino.
Segundo Aquino, que é também secretário de Assuntos Portuários e Marítimos de Santos, “as próprias empresas entendem que devem evitar o desequilíbrio no sistema e não podem tirar quadros funcionais de concorrentes”. Para o especialista, a iniciativa privada está consciente de que o ideal é gerar mão de obra para atender suas necessidades.
Com base nisto, ele acredita que o treinamento dos profissionais a serem contratados pela BTP e pela Embraport pode ser também benéfico para o restante do Porto. “A compra de simuladores é uma coisa que está sendo estudada. Possivelmente, estes equipamentos ficariam nos terminais ( para treinar sua mão de obra), mas negociamos que as empresas os disponham também para os demais trabalhadores do Ogmo”.